ATENÇÃO! Todas as informações e valores contidas neste artigo são referentes a data de publicação. Devido ao labirinto tributário brasileiro e ao insano volume de normas, portarias, regras e leis emitidas e criadas todos os dias é praticamente impossível estar sempre atualizado, caso você não seja uma pessoa dedicada ao assunto.
Entendendo o problema: o aluguel como renda tributável
Quando um imóvel residencial ou comercial é alugado por uma Pessoa Jurídica (PJ) e o proprietário é uma Pessoa Física (PF), surge um dos pontos mais negligenciados — e arriscados — da gestão de aluguéis no Brasil: o correto recolhimento e declaração do Imposto de Renda (IR). A maioria das imobiliárias ainda lida com esse tema com a leveza de quem prefere não ver, não ouvir e não tocar. Mas ignorar a legislação não livra ninguém das suas obrigações — só acumula problemas silenciosos.
O aluguel recebido por um proprietário pessoa física é, por definição, renda tributável. E quando o locatário é uma empresa, a legislação impõe uma exigência clara: a própria PJ locatária é obrigada a reter e recolher o IR na fonte, sobre o valor pago ao locador PF. O nome técnico disso é carnê-leão retido na fonte. E quem deve orientar, acompanhar e garantir que tudo seja feito corretamente? A imobiliária. Se ela atua como administradora, não pode se esconder atrás de um contrato genérico ou de um sistema automatizado que finge resolver o que mal compreende.
Qual é a obrigação da empresa locatária?
A empresa que aluga o imóvel tem, por força da Instrução Normativa RFB nº 1.500/2014, a obrigação de:
- Reter o Imposto de Renda na Fonte (IRRF), aplicando a tabela progressiva mensal da Receita Federal sobre o valor do aluguel pago;
- Recolher o imposto até o último dia útil do mês subsequente ao pagamento, usando o código 3208 no DARF;
- Informar à Receita Federal, via DIRF ou eSocial, os pagamentos realizados e o imposto retido.
Se a empresa deixar de fazer isso, está cometendo infração tributária — e a Receita Federal pode cobrar o imposto não retido, com multa e juros. E não é raro o proprietário PF ser pego de surpresa, porque acreditava que a empresa “já cuidava disso” ou, pior, achava que a imobiliária fazia a retenção automaticamente.
O papel da imobiliária: omissão ou orientação?
A imobiliária que administra o aluguel tem a obrigação moral e profissional de orientar o proprietário e o inquilino corretamente. Não cabe à administradora recolher o imposto no lugar da empresa locatária, mas cabe a ela:
- Informar o locatário PJ sobre sua obrigação de reter e recolher o IR;
- Monitorar se os recolhimentos estão sendo feitos corretamente, principalmente em contratos mais longos ou com valores elevados;
- Incluir cláusula contratual que trata especificamente dessa responsabilidade;
- Enviar relatórios claros ao proprietário, informando os valores pagos, retidos e repassados, com a indicação do valor líquido recebido e dos impostos incidentes;
- Emitir o boleto mensal, já com o valor do IR descontado.
Não fazer nada é colocar todos os envolvidos — inclusive a própria imobiliária — em risco. O proprietário pode ser multado por omitir rendimentos. O inquilino pode ser autuado por não recolher corretamente. E a imobiliária pode ser responsabilizada judicialmente por omissão ou má orientação, caso se configure negligência administrativa.
A confusão mais comum: achar que o IR é responsabilidade da imobiliária
O erro mais comum é o proprietário acreditar que a imobiliária já desconta ou recolhe o imposto — o que só é verdade no caso do carnê-leão gerado pela própria administradora, quando não há retenção na fonte. Mas no caso de aluguel pago por pessoa jurídica, a responsabilidade é da empresa inquilina, e não da imobiliária ou do proprietário.
É exatamente por isso que a comunicação e a transparência da imobiliária precisam ser exemplares. Nada de recibos que mostram apenas o valor líquido. Nada de relatórios incompletos. E, principalmente, nada de omitir o que a Receita, mais cedo ou mais tarde, vai descobrir.
Como estruturar a gestão tributária nesses casos
Uma operação profissional de aluguéis deve ter, no mínimo:
1. Cláusula contratual específica
Ambos os contratos — o de administração e o de locação — devem prever expressamente a questão do IRRF quando o locatário for PJ. A cláusula precisa indicar quem é o responsável pelo recolhimento, como isso será feito e como será reportado à imobiliária e ao proprietário.
2. Modelo de recibo completo
O recibo mensal deve apresentar:
- Valor bruto do aluguel
- Valor retido de IR (se houver)
- Valor líquido pago ao proprietário
- Nome e CNPJ do locatário
- Código do DARF utilizado no recolhimento
3. Relatórios anuais de apoio ao IRPF
No início de cada ano, a imobiliária deve fornecer ao proprietário um relatório anual com todos os valores recebidos, impostos retidos e eventuais divergências. Isso facilita a declaração do Imposto de Renda e evita erros de preenchimento ou omissões.
4. Acompanhamento jurídico e contábil
Para evitar interpretações equivocadas, é prudente que a imobiliária mantenha consultoria jurídica e contábil especializada. Isso protege não só o cliente, mas a própria operação.
A omissão é mais cara que a prevenção
Há um pensamento recorrente no mercado: “Se ninguém reclama, é porque está tudo certo.” Essa lógica é a receita exata do desastre. No Brasil, o sistema tributário é complexo, sim — mas não é opcional. A Receita Federal vem cruzando dados com cada vez mais precisão. E a cadeia locatícia está na mira.
A imobiliária que atua de forma passiva diante desse tema está cavando sua própria cova. A que se posiciona como agente de orientação, prevenção e transparência constrói algo muito mais valioso: confiança de longo prazo.
Porque administrar aluguéis não é só receber aluguel — é proteger pessoas. E proteger pessoas exige coragem para tratar de temas difíceis, como o Imposto de Renda.