A falsa guerra entre lados que deveriam cooperar
Durante décadas, o mercado imobiliário alimentou uma narrativa silenciosa, mas corrosiva: a de que inquilinos e proprietários estão em lados opostos de uma disputa. De um lado, o locador, dono do bem, que se sente constantemente ameaçado por atrasos, danos e leis “protecionistas”. Do outro, o inquilino, tratado como um risco ambulante, visto com desconfiança, como alguém que sempre vai “dar problema”.
Essa mentalidade, enraizada em práticas antigas, é mais do que ultrapassada — é destrutiva. Alimenta relações tensas, processos conflituosos e uma cultura onde todos perdem: perde o proprietário, que desconfia de todos; perde o inquilino, que se sente mal recebido; perde a imobiliária, que vira árbitra de uma disputa que não deveria existir.
Inquilinos são clientes, não adversários
A base de qualquer negócio bem-sucedido é uma verdade simples: o cliente precisa ser bem tratado. E na locação, o inquilino é tão cliente quanto o proprietário. É ele quem mantém o imóvel ocupado, a renda circulando, a operação viva. Um imóvel vazio não paga contas. Um imóvel ocupado, sim.
Tratar o inquilino como um inimigo em potencial é como um restaurante que vê seus frequentadores como intrusos. Não faz sentido. É uma postura que mina a confiança, dificulta o relacionamento e aumenta o risco de conflitos. Mais do que nunca, a gestão moderna de aluguéis exige que o inquilino seja compreendido, respeitado e atendido com empatia.
O que o inquilino realmente quer?
Existe um mito persistente de que o inquilino está sempre tentando “levar vantagem”. Mas a realidade é bem mais simples e humana. A maioria dos locatários quer:
- Um lar seguro e funcional
- Um canal de comunicação claro com a imobiliária
- Transparência nas cobranças e reajustes
- Agilidade na resolução de problemas
- Respeito nos atendimentos
Isso não é pedir demais — é o mínimo em qualquer relação comercial civilizada. Quando o inquilino encontra isso, ele tende a permanecer no imóvel, cuidar melhor dele, e gerar menos custos operacionais. Em outras palavras: um bom inquilino é um ativo, não um fardo.
Como as imobiliárias podem virar a chave
Mudar essa mentalidade exige mais do que discurso. É preciso rever práticas. A seguir, alguns pontos essenciais:
1. Atendimento humanizado
Automatizar processos não é desculpa para desumanizar relações. É possível ter eficiência sem frieza. Um e-mail que informa uma cobrança pode ser claro e respeitoso. Um atendimento via WhatsApp pode ser rápido e cordial. Cada ponto de contato molda a imagem da imobiliária.
2. Clareza na comunicação
Grande parte dos atritos entre locador e locatário nasce de falhas de comunicação. Quem paga por determinada manutenção? Quando o reajuste será aplicado? O que acontece em caso de rescisão antecipada? Tudo isso deve estar bem explicado desde o início, no contrato e nas conversas.
3. Agilidade na resolução de problemas
Para o inquilino, um vazamento ou uma infiltração não é um detalhe técnico — é um transtorno real. Ignorar chamados ou empurrar com a barriga desgasta a relação e aumenta a chance de judicialização. Ter processos claros e rápidos para lidar com esses casos é sinal de profissionalismo.
4. Educação do locador
Muitos proprietários ainda veem o aluguel como uma renda passiva sem obrigações. Cabe à imobiliária educar seus clientes — com firmeza e gentileza — sobre seus deveres e sobre a importância de um bom relacionamento com o inquilino. Isso inclui entender a Lei do Inquilinato, aceitar ajustes razoáveis, respeitar os prazos legais e reconhecer que o imóvel alugado é, temporariamente, o lar de outra pessoa.
5. Mediação e não confronto
Quando surgem conflitos — e eles surgem — a imobiliária deve atuar como mediadora imparcial, e não como defensora cega do proprietário. Impor cobranças indevidas ou ignorar demandas legítimas do inquilino apenas agrava o problema. Resolver com equilíbrio é o caminho mais rápido e menos custoso.
A paz entre as partes é boa para todos
Em um mercado cada vez mais competitivo, com plataformas digitais, aluguel por temporada e locações diretas em ascensão, fidelizar tanto proprietários quanto inquilinos é uma questão de sobrevivência para muitas imobiliárias. E fidelização nasce da confiança, não da intimidação.
Uma gestão de aluguéis realmente eficiente precisa deixar para trás a lógica da guerra. Precisa abandonar a cultura do medo e da desconfiança, substituindo-a por uma cultura de serviço, escuta e responsabilidade.
Tratar o inquilino com respeito não é abrir mão da autoridade — é construir autoridade com base na ética e na competência. Quando isso acontece, o contrato de locação deixa de ser uma bomba-relógio para se tornar aquilo que deveria sempre ter sido: uma relação de troca justa, onde todos saem ganhando.